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Os cinco anos do selo evangélico da Sony Music Brasil no olhar de Maurício Soares

Redação em 29/01/16 2348 visualizações

Na primeira edição da Gospel Fair, ocorrida em Goiânia no ano de 2014, a gravadora Sony Music se fez presente com stand e vários artistas. Em 2015, o feito foi repetido. Dentre os sujeitos ali, estava Maurício Soares. Diretor do selo evangélico da gravadora, observador e de aparência séria, recebeu a equipe do Super Gospel e falou de suas visões acerca do mercado evangélico e de suas atividades dentro da Sony Music Brasil nos últimos cinco anos. Publicitário e jornalista, passou por gravadoras como a MK Music, Line Records, Toque no Altar Music e Graça Music. Há quase seis anos à frente do selo evangélico da Sony Music Brasil, garante estar vivendo novas experiências e aprendizados.

A história começou em meados de 2009. Após iniciar projetos para a criação de um selo próprio, Maurício passou a trabalhar com a banda Resgate. Mais tarde, com a proposta de criação do selo evangélico da Sony Music Brasil, o grupo paulista foi o primeiro contratado. De lá para cá, são mais de cinco anos, obras nacionais e internacionais distribuídas e contratações que vão desde a nomes notórios, quanto a artistas outrora independentes, hoje parte do mainstream musical evangélico. Esta sequência de lançamentos começou com um disco chamado Ainda não É o Último, em 30 de abril de 2010.

Vanguarda

"Este disco foi produzido pelo Dudu Borges, hoje um dos maiores produtores da música brasileira", destacou Maurício. "Talvez seja o melhor disco da história do Resgate. Acho que eles não podiam ter estreado na Sony com um projeto melhor do que aquele". A última frase de Maurício Soares, possivelmente, se enquadra a outros títulos da gravadora. Além de Resgate, nos últimos cinco anos, várias obras se destacaram pelo teor vanguardista. Dentre eles, Reinas em Glória, retorno de Álvaro Tito após anos sem um registro de inéditas. Daniela Araújo, de 2011 aos dias de hoje, se tornou um fenômeno no cenário evangélico. Tudo isto ocorreu com seu primeiro registro, com distribuição da Sony.

Maurício, no entanto, reitera que vários nomes novos foram trabalhados em sua gestão na Graça Music, como Thalles, Mariana Valadão, DiscoPraise e Ao Cubo. "Hoje, na Sony Music, temos espaço para o Canção do Céu, Marcela Taís, o Leonardo [Gonçalves], que era considerado um artista extremamente segmentado". Ele acredita que seu trabalho se diferencia da maior parte das gravadoras presentes no segmento: "As gravadoras optaram pelo feijão com arroz, pela menor margem de risco. Há muito tempo não vejo nestas gravadoras algum artista realmente novo sendo investido. Nós, aqui, temos Gabriela Rocha, Priscilla Alcântara. É estratégia. Não posso falar da estratégia da concorrência, mas efetivamente não vejo do ponto de vista das gravadoras do segmento uma visão artística", lamenta.

Maurício vai mais fundo. Ao enxergar deficiências que, segundo ele, dizem respeito à visão artística, reitera que os interesses da Sony é diferente de muitos dos selos atuantes no mercado evangélico. "Boa parte delas estão ligadas a denominações, grupos políticos ou áreas que não sejam focadas em negócios e arte. O primeiro foco de uma gravadora ligada a uma igreja é atender as necessidades internas. Você vê hoje gravadoras com artistas que vendem números estratosféricos e não tocam em rádios. Você não os veem fazendo eventos. E estão ganhando disco de ouro, platina, diamante... Mas é para consumo interno. Para o artista, isso é muito ruim. Cria uma dependência daquele grupo".

Estes novos nomes da multinacional, obviamente, possuem espaço através de outros nomes consagrados do pentecostal e congregacional lançados pela Sony. Alexandre Schiavo, ex-presidente da divisão brasileira, em 2014 numa entrevista ao jornal O Globo, afirmou que os artistas evangélicos da gravadora estão no segundo lugar nos rendimentos da Sony Music Brasil, perdendo apenas para o famigerado sertanejo. Uma destas intérpretes é Damares. Seu último disco, O Maior Troféu, vendeu mais de 240 mil cópias no país e mostrou direcionamento lírico distinto na carreira da paranaense ao ter canções mais maduras, como a faixa-título.

Vendas, apuração e imprensa

O termo "gravadoras evangélicas", para Maurício, é muito amplo. Em sua visão, existem de fato gravadoras, mas também selos criados para atender demandas de certas igrejas. Em relação aos números de vendas, ele se mostra cauteloso e cita a Associação Brasileira dos Produtores de Disco (ABPD): "Somente uma gravadora evangélica, tirando as majors, é ligada a ABPD e mesmo assim até onde lhe convém". Soares diz que o correto, para a ABPD, é reportar os números de vendas e apresentar relatórios mensalmente. "Essa gravadora evangélica, por exemplo, quer uma parte do benefício, mas não quer fazer parte do serviço".

Maurício Soares afirma que numa entrevista com a Veja, cuja matéria foi o chamado indie gospel, foi questionado pelos números de venda. Ele respondeu: "Não temos números. Os números do mercado evangélico são oficiosos. Não há uma associação, um órgão envolvido. Nós, das majors do secular, todos enviamos nossos números para a ABPD. Então eu sei qual o disco mais vendido do Brasil de verdade. No meio evangélico, não".

As revistas e portais de notícias evangélicos, em suas funções de apurar e investigar estes dados, na sua visão, também tem deixado a desejar: "A capacitação no meio evangélico é muito baixa. São poucos profissionais que temos nas áreas, há uma demanda grande, mas é um mercado em que poucos podem se estabelecer".

Stand Sony Music na Gospel Fair 2015. Foto: Kazuo

Contratações

Maurício enfatizou que, em média, as contratações da Sony Music são de três anos. Dentro deste período, passaram vários artistas pela gravadora. O publicitário explica a política de relacionamento da multinacional com seu cast: "Como qualquer relação, há um tempo de maturação. Você está dentro de uma gravadora 'secular'. Por mais que ela tenha um selo gospel, há uma dinâmica e estrutura própria. Alguns artistas se adaptam perfeitamente a essa realidade, como o Leonardo Gonçalves, Gabriela Rocha e tantos outros. Outros quiseram trazer uma realidade de gravadora gospel para dentro de outra estrutura e não houve boa sinergia".

A boa sinergia, segundo Soares, não é algo que se força. Em seguida, com certo tom de reflexão, critica: "Eu acho que as gravadoras evangélicas têm uma visão de que um artista é um patrimônio. Nós preferimos manter um artista como um relacionamento. Há relacionamentos que fluem, outros não". Ele enfatizou que, nos casos de distribuição, o músico tem maior independência neste processo. Maurício citou, por exemplo, o cantor Carlinhos Felix: "É ele quem diz quando é que ele entrega um disco novo. O Carlinhos continua conosco".

Mercado digital

As possibilidades do mercado digital foram enfatizadas por Maurício Soares em vários momentos. Apesar de ainda investir nos produtos físicos, o diretor acredita que o mercado digital não é projeção, e sim realidade. Ele diz: "70% das vendas da companhia hoje são digitais, há um marketing digital muito grande. Mas ao mesmo tempo, não podemos abandonar o físico. Ainda há muita água para correr por baixo desta ponte. E, diferentemente da época do LP para o CD, não está acontecendo uma ruptura imediata". Ele afirma que ainda é possível ter boas vendagens de produtos físicos, embora "a gente não pode se enganar achando que o mercado evangélico vai continuar tendo o físico forte como era no passado".

Quando questionado acerca da força histórica do single no mercado brasileiro em geral, incluindo o gospel, Maurício tem suas ressalvas. Ele acredita que o pouco êxito do formato não se deve à falta de cultura ou demanda do público. "É uma realidade de tecnologia de mercado", afirma. Soares ressaltou seu uso nas décadas de 1970 e 1980 como teste de músicas e artistas. Em sua visão, a partir do momento em que os vinis foram substituídos pelos CDs, o single perdeu sua força.

Leonardo Gonçalves, Os Arrais e Tanlan: Artistas Sony que lançaram singles em 2015. Imagem: Reprodução

Apesar disso, o diretor afirma que a importância do single hoje, além dos EPs, no mercado digital é completamente diferente. "A maior prova recente disso é o EP dos Arrais. Ele ficou em primeiro lugar por cinco dias no iTunes. A música [Acredito] do Leonardo Gonçalves ficou em primeiro lugar. Foram três milhões de views [no YouTube]". Utilizando estes exemplos, diz que o consumo do público hoje é diferente de cinco anos atrás, quando a Sony adentrou o mercado evangélico.

Ao falar dos singles, EPs e clipes, Maurício também aborda o lyric video: "A música hoje é uma experiência não só de áudio, mas visual. Se ela é acompanhada de vídeo, passa a ter uma importância de 100%". Por fim, diz: "Há espaço pra todos. O que falta, talvez, no meio evangélico, é um pouco mais de foco, competência e principalmente planejamento, tanto da parte dos artistas, das gravadoras, dos lojistas".

Novo movimento

"Quando a gente começa a se preocupar com públicos, segmentos e com rótulos, estamos perdendo". Maurício é cuidadoso ao dizer como a gravadora lida com artistas do novo movimento, como a Tanlan. Ele diz que, em sua visão, há músicas boas e ruins, e dependendo da estratégia utilizada, a música possui a capacidade de se comunicar com diferentes públicos. "A banda Tanlan, especificamente, surgiu num cenário do Rio Grande do Sul como um grupo de pop rock. São todos evangélicos, que tocam muito em eventos evangélicos, mas tocaram por muito tempo em bares e eventos seculares".

Ele não acredita, no entanto, que a trajetória da Tanlan sirva como um molde para outros grupos, embora no caso do quarteto, tenham se encaixado bem nesta proposta. Apesar de não citar nomes, Maurício não poupou críticas a certos músicos: "O que eu não consigo engolir é alguns artistas do nosso segmento evangélico que querem trazer uma carreira crossover, mas no fundo, 99% da agenda deles é congresso de jovens, igrejas. Alguns, inclusive, vivem de ministério pastoral. Tudo gospel, mas um discurso muito piegas e fraco de que sua música não é feita pra 'crente'. Então, com todo o respeito, saia do circuito evangélico. Vá viver no circuito secular, vá se beneficiar de cachês no circuito secular. Se você crê que sua mensagem não é para ser consumida ou não pode ser entendida por cristãos, então tome coragem e vá enfrentar a selva que é o mercado secular".

Ele conclui, dizendo: "Acho que viver essa dicotomia de não fazer música para crente, mas vive dos crentes, tocando em eventos evangélicos e as vezes até mesmo com salário de pastor de igreja é um discurso cego".

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