Análises

Ouvimos o novo trabalho ao vivo do Rebanhão - 35. Confira nossa crítica

Georgeton Leal em 30/01/18 2677 visualizações
Certamente, um dos “revivals” mais aguardados na música cristã brasileira nos últimos anos tem sido o retorno do Rebanhão com os remanescentes de sua formação clássica. Tal reunião era considerada improvável por muitos fãs, uma vez que já se passara mais de duas décadas desde a separação dos integrantes pioneiros do grupo, ocorrida em 1992. No entanto, para surpresa de muitos, em 2014, Pedro Braconnot anunciou nas redes sociais a volta da banda para um trabalho comemorativo aos seus 35 anos, com presença confirmada de Carlinhos Felix (vocal) e Paulo Marotta (baixo), além das participações de Pablo Chies (guitarra) e Bruno Martins (bateria). No entanto, devido alguns entraves, o registro fora adiado, sendo gravado apenas em novembro de 2016, no Rio de Janeiro e distribuído pela Onimusic.

Vale lembrar que muito antes de Katsbarnea, Oficina G3, Catedral, Resgate e outros, Rebanhão foi um dos primeiros representantes da revolução sonora que mudou a forma como os cristãos brasileiros faziam música até o final dos anos 1970. Por ter arriscado em influências que passavam desde o rock até a Tropicália, a banda ousou ir contra os paradigmas musicais que limitavam os artistas da época, e inovou também com letras inusitadas que abordavam não apenas assuntos inerentes à vida cristã, mas também, questões voltadas aos problemas sociais da atualidade.

Como todo trabalho antológico, a expectativa é de que a escolha das músicas fosse algo feito com bastante cuidado, ainda mais, em se tratando de Rebanhão, que colecionou significativos hits ao longo de sua discografia. Quase todos os principais clássicos do grupo estão presentes aqui em um repertório bem equilibrado, que faz jus desde sua fase mais experimental até a fase onde o pop tornou-se mais proeminente em suas últimas produções nos anos 1990. Nota-se, no entanto, certo favorecimento em prol do álbum Princípio (1990), uma vez que foi o disco de maior sucesso da banda, tanto entre o público como pela crítica. Em contrapartida, alguns ouvintes de longa data poderão sentir falta de hits como “Mel”, “Taças de Cristais”, "Primeiro Amor" e “Nele Você pode Confiar”.

Muito além de um retorno marcado somente pelo saudosismo, Rebanhão brinda a todos com um trabalho arrebatador e sem excessos. Em critério de relevância, este é visivelmente o melhor trabalho do grupo desde o álbum Pé na Estrada (1991). Ainda que boa parte dos arranjos possam ser considerados “datados” por muitos, esse é justamente um dos pontos que conservam viva a identidade musical da banda carioca e por isso mesmo, as releituras respeitam o perfil original das canções. Neste aspecto, Pedro Braconnot ainda se mostra atualizado no uso de efeitos e sintetizadores, provando ser um dos tecladistas mais criativos do cenário evangélico.

Alternado a liderança vocal entre Carlinhos Felix, Pedro Braconnot e Paulo Marotta, o ouvinte passeia por grandes clássicos de um período onde a liberdade criativa pulsava de maneira espontânea, sem estar completamente subjugada pelos ditames comerciais do mercado fonográfico cristão. A produção é marcada por instrumentais relativamente modestos, fazendo valer um ótimo cardápio sonoro que não se prende a fórmulas enlatadas. As composições de Janires (1953–1988) são distribuídas nas vozes dos três integrantes e não geram desconforto em comparação aos registros originais. Pablo Chies oferece boas coberturas de guitarra, o que dá liberdade para Carlinhos desenvolver suas interpretações conforme a maturidade vocal que adquiriu em mais de trinta anos de estrada. E Bruno Martins, em comparação a ex-bateristas do grupo como Kandell, Sérgio Batera e Wagner Carvalho, mantém a sintonia, eficiência e simplicidade nas baquetas.

A diversidade temática das canções é notável, abordando inclusive assuntos polêmicos (crise ambiental, violência, etc), porém, sob a ótica da cosmovisão cristã, como é o caso das músicas Princípio e Muro de Pedra. O lirismo singelo e poético de Casinha ganha um belo acompanhamento de violino, assim como Hoje sou Feliz, que também é executada ao estilo voz e violão, cujos versos retratam as desilusões do homem perante a dura realidade da vida. Característica forte até meados dos anos 1990, as letras evangelísticas são bem exploradas em canções como Arsenal, Selo do Perdão e Metrô. A sonoridade imersiva de Refúgio resgata em linda roupagem uma das melhores baladas dos primórdios do grupo, enquanto Pastor da Minha Alma demonstra que seu vigor pop continua correto e arrojado. Palácios não se desgasta mesmo depois de inúmeras releituras feitas por outros artistas e Baião jamais perde sua representatividade como um dos sucessos mais inventivos do grupo, encerrando assim o projeto com “chave de ouro”.

Hoje, após superar todas as impressões controversas que já tentaram o estigmatizar no passado, Rebanhão se mostra mais do que nunca como uma banda consagrada e fundamental dentro da história do segmento cristão. Sua música foi colocada à prova e passou no teste do tempo, e tornou-se um referencial que vai além de sua época e se eterniza dentro de nossa história e alcança, inclusive, novas gerações com sua mensagem. 35, assim, é um excerto do poder musical e lírico que o conjunto carioca exibiu ao longo de 20 anos de forma avassaladora por meio de canções.

Avaliação: 4,5/5
35

(CD) 01/17


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Georgeton Leal

Professor formado em Letras pela Universidade Estadual do Maranhão (UEMA) e blogueiro literário nas horas vagas.


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