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Ouvimos o novo trabalho do rapper Kivitz - Em Nome do Vento. Confira nossa crítica

Tiago Abreu em 21/05/18 1118 visualizações
Com quatro EPs de raps diretos que evocam uma narrativa urbana tecida na autocrítica, Kivitz provou que é o rapper mais interessante do cenário evangélico dos últimos anos. Mas o rap feito por cristãos, diferentemente de qualquer outro gênero da cena religiosa, nunca ficou preso ao circuito protestante. Com Kivitz não é diferente. Por isso, Em Nome do Vento, primeiro full do artista, obedece as bases pelas quais sua obra é conhecida, mas numa coragem e versatilidade que, há quase 20 anos, não se via no meio evangélico.

Há quase 20 anos porque o único rapper evangélico competente o suficiente em trazer, dentro de canções, uma leitura social contextualizada e provocante àquela época foi Pregador Luo. Desde o lançamento de 2ª Vinda, a Cura (2000), nenhum outro artista do segmento teve a mesma coragem de não ser polido, de não recair em clichês e em apontar soluções simples para problemas complexos. Kivitz sabe muito bem disso e é por isso que em Humildade, canção na qual demonstra sua paixão pelo rap, presta homenagens justamente aos seus veteranos.

A identidade é o fio condutor do registro. Por ela, Kivitz explora suas fraquezas como ser humano e aquilo pelo qual o constituiu como sujeito. Um lado do projeto é formado por declarações de amor ao rap e pelas possibilidades de visão de mundo que o gênero, com seus artistas, proporcionou a um sujeito tão versátil quanto decidido em suas visões. A construção musical do álbum, com a colaboração de produtores como Biro (Coisa de Menino) e DJ Comum (Juro que eu Tento) é tão urbana o quanto pede e introspectiva quando as angústias do rapper são derramadas.

É exatamente por isso que Kivitz, ao abrir seu coração em um registro "duro", não abre mão de palavras fortes em Fora da Curva e questiona os possíveis questionamentos de seu cansaço em Paciência pra Quem Vai no Front. A fragilidade e a coragem, aparentemente antíteses, se condensam no que o rapper é neste disco. Neste processo de vulnerabilidade, todo o background do artista com o meio evangélico pode incriminá-lo entre os mais conservadores, porém, para o ouvinte mais atento, seus versos apenas constroem a visão de Kivitz como um homem de múltiplas camadas.

O mundo de Kivitz, como um típico ser humano, é formado por momentos obscuros. E o outro lado do projeto examina suas inadequações com o cristianismo numa relação com o divino. Ao mesmo tempo que consegue questionar movimentos sociais, também põe em xeque, intimamente, estruturas eclesiásticas. Um dos excertos é a honestidade de Confissões, melhor canção do álbum. É uma declaração em busca de respostas, mas também um pedido de ajuda. O projeto fica mais íntimo ao longo de sua trajetória. Além dos DJs, o trabalho ainda é abrilhantado pela colaboração brilhante com Paulo Nazareth em Vaso de Barro, um complemento da faixa anterior sob produção musical de Daniel Maia.

Tantos produtores e participações poderiam tirar a consistência do disco. Mas Kivitz mantém um olhar muito atento na direção artística do álbum. Assim, conseguiu cumprir o tom contestador que o rap deve ser. Também é um raro trabalho de fato artístico em suas temáticas cristãs, sem compromissos com dicotomias ou discursos agradáveis. Em Nome do Vento explora, com maior complexidade, a versatilidade, as fraquezas e medos de Kivitz numa intensidade até então não vista em seus registros antecessores.

Avaliação: 4,5/5
Em Nome do Vento

(CD) 01/18


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Tiago Abreu

Jornalista formado pela Universidade Federal de Goiás (UFG), escreveu para o Super Gospel entre 2011 a 2019. É autor de várias resenhas críticas, artigos, notícias e entrevistas publicadas no portal, incluindo temas de atualidade e historiografia musical.


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